A partir de 2024, espera-se maior diálogo entre o governo brasileiro e o Banco Central, com foco na regulamentação de criptoativos, vale-alimentação e títulos da dívida pública.
O governo brasileiro espera uma maior cooperação técnica com o Banco Central a partir de janeiro de 2024, quando Gabriel Galípolo, atual diretor de Política Monetária, assumirá a presidência da instituição. A expectativa é que, com sua chegada, o diálogo entre o Banco Central e o Ministério da Fazenda seja mais fluido, especialmente em temas que não estão diretamente relacionados à política de juros.
Tensão entre Governo e Banco Central na Gestão de Campos Neto
Desde o início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, em janeiro de 2023, houve críticas constantes à condução da política monetária, com foco na taxa de juros elevada. O presidente Lula e sua equipe expressaram descontentamento com o presidente atual do Banco Central, Roberto Campos Neto, nomeado por Jair Bolsonaro. Segundo fontes do Ministério da Fazenda, a falta de diálogo em pautas importantes, como regulamentação de criptoativos, abertura do mercado de vale-alimentação e inclusão de títulos da dívida pública em plataformas globais, contribuiu para o distanciamento entre as instituições.
A autonomia do Banco Central, assegurada por lei desde 2021, foi apontada como um dos fatores que dificultaram um aprofundamento nas conversas. No entanto, há a expectativa de que com a chegada de Galípolo, indicado pelo próprio Lula, as relações sejam destravadas, favorecendo uma cooperação mais ativa e eficiente.
Regulamentação de Criptoativos: Uma Pauta Sensível
Um dos temas mais discutidos entre a Fazenda e o Banco Central é a regulamentação dos criptoativos. A Fazenda tem interesse em alinhar essa regulamentação com outras iniciativas, como as regras para apostas online, para evitar conflitos e sobreposição de normas. No entanto, as autoridades relatam que, até o momento, o diálogo sobre criptoativos foi insuficiente, o que tem gerado preocupações sobre a eficácia das regulações propostas.
Em janeiro de 2023, o Banco Central realizou uma consulta pública sobre os regramentos para ativos virtuais. Embora as discussões estejam em andamento, ainda há indefinições sobre os próximos passos, com propostas normativas esperadas para o final deste ano. A expectativa é de que, sob a liderança de Galípolo, haja uma maior integração entre o Banco Central e a Fazenda para garantir uma regulamentação mais coesa e eficaz para o mercado de criptoativos.
Impasses no Mercado de Vale-Alimentação
Outro tema que enfrenta obstáculos é a regulamentação do mercado de vale-alimentação e vale-refeição, que movimenta cerca de 150 bilhões de reais e atende aproximadamente 22 milhões de trabalhadores formais no Brasil. Desde 2022, há uma legislação que prevê a interoperabilidade e portabilidade dos créditos concedidos pelas empresas. No entanto, falta definir quem será o responsável por editar e supervisionar as novas regras.
O Ministério da Fazenda vê o Banco Central como o órgão ideal para assumir essa responsabilidade, mas a instituição tem resistido, alegando falta de recursos para administrar um mercado considerado grande, mas que não representa risco sistêmico. Em reuniões recentes, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sinalizou que a regulamentação poderia ser implementada no início de 2024. No entanto, a definição ainda depende de acordos com o Banco Central, que não está totalmente convencido sobre o tema.
Inclusão de Títulos do Tesouro Nacional na Euroclear
Um terceiro ponto de discórdia entre o governo e o Banco Central é a inclusão de títulos da dívida pública brasileira na plataforma global Euroclear, que facilitaria o acesso de investidores estrangeiros aos papéis da dívida interna. Embora a Fazenda e o Tesouro Nacional considerem essa medida como uma oportunidade para simplificar o acesso aos títulos e reduzir custos, o Banco Central tem demonstrado resistência, alegando a necessidade de manter o controle sobre as informações relativas às emissões e detentores da dívida brasileira.
Essa resistência é vista pelo Ministério da Fazenda como um ato de “corporativismo”, que trava uma negociação que poderia gerar economias significativas para o país. O Banco Central argumenta que o monitoramento em tempo real das operações seria comprometido em um contrato com a Euroclear, o que aumentaria os riscos de práticas como lavagem de dinheiro.
Apesar disso, o Tesouro Nacional e o Banco Central formaram uma força-tarefa em 2023 para discutir os preparativos técnicos necessários para viabilizar essa negociação. Até o momento, os debates não avançaram de forma substancial, mas há esperança de que a chegada de Gabriel Galípolo facilite o destravamento desse impasse.
Perspectivas para 2024
Com Gabriel Galípolo assumindo a presidência do Banco Central em janeiro de 2024, há otimismo de que as relações entre o governo e a autarquia se tornem mais harmoniosas. A expectativa é que temas importantes, como a regulamentação de criptoativos, a abertura do mercado de vale-alimentação e a inclusão dos títulos do Tesouro na Euroclear, avancem de forma mais ágil e coordenada.
A integração entre a Fazenda e o Banco Central será crucial para garantir que o Brasil consiga implementar reformas que fortaleçam a economia e tragam mais segurança ao sistema financeiro. A cooperação entre as duas instituições será fundamental para enfrentar os desafios econômicos que o país terá nos próximos anos, especialmente em um contexto global incerto e de altas taxas de juros.