Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, alerta sobre a inflação no Brasil e adota medidas para realinhar as expectativas do mercado. Entenda o impacto na taxa Selic e nas metas de inflação.
Durante a UK Brazil Conference, promovida pelo Grupo de Líderes Empresariais (Lide) em Londres, o presidente do Banco Central do Brasil, Roberto Campos Neto, chamou atenção para um desafio central: a desancoragem das expectativas de inflação. Ele destacou que o movimento de alta na inflação preocupa a autoridade monetária, que iniciou um ciclo de ajustes para realinhar essas expectativas, enfatizando a importância da estabilidade inflacionária para a política de metas.
Desancoragem das Expectativas de Inflação: Por Que é um Problema?
A desancoragem das expectativas ocorre quando os agentes de mercado começam a acreditar que a inflação não voltará à meta estabelecida pelo Banco Central, o que compromete a eficácia da política monetária. A meta de inflação é central para o planejamento econômico, impactando desde as taxas de juros aplicadas ao crédito até as previsões de investimento. Campos Neto mencionou que, tanto nas pesquisas de inflação quanto nas projeções de mercado, os valores estão descolados da meta, e essa descrença na convergência da inflação leva o Banco Central a tomar medidas mais severas.
Esse afastamento das expectativas inflacionárias cria incertezas, já que as pessoas passam a ajustar seus gastos e investimentos de acordo com uma previsão de aumento contínuo dos preços, que pode se tornar uma profecia autorrealizável. Para combater isso, o Banco Central precisa reestabelecer a confiança no retorno da inflação ao centro da meta.
Inflação de Serviços: Um Ponto Crítico para o Banco Central
Outro aspecto relevante para o Banco Central é a inflação de serviços, que continua alta tanto no Brasil quanto globalmente. Campos Neto destacou que o processo de desinflação — a desaceleração do ritmo de crescimento dos preços — não será completo sem uma queda significativa na inflação de serviços. Itens como aluguel, educação e saúde, que compõem grande parte dos serviços, têm impacto direto no custo de vida e resistem a reduções de preço devido a fatores estruturais.
A inflação de serviços representa um desafio, pois, ao contrário dos bens, cujo preço pode cair rapidamente com a desaceleração da demanda, o setor de serviços responde mais lentamente a mudanças nas condições econômicas. Dessa forma, o controle da inflação geral exige que o Banco Central aplique uma política monetária rigorosa, com impacto em todo o sistema econômico.
Ciclo de Alta na Taxa Selic: Uma Resposta ao Desafio Inflacionário
Para enfrentar a pressão inflacionária, o Banco Central iniciou em setembro um ciclo de alta na taxa Selic, aumentando-a em 0,25 ponto percentual, para 10,75% ao ano. Esse ajuste reflete o comprometimento da autoridade monetária em estabilizar a inflação, promovendo uma desaceleração da economia para reduzir a demanda. Campos Neto justificou que o aumento na Selic se tornou essencial devido a uma atividade econômica resiliente e ao aquecimento do mercado de trabalho, o que também exerce pressão sobre os preços.
A taxa de juros alta atua como uma ferramenta para conter o consumo e, portanto, a inflação. Ao encarecer o crédito, o Banco Central busca reduzir a pressão de demanda, o que, em teoria, deve ajudar a equilibrar os preços. Contudo, esse movimento pode ter implicações para o crescimento econômico, exigindo uma calibragem cuidadosa para que os ajustes na Selic não resultem em uma desaceleração excessiva.
Projeções de Mercado e o Boletim Focus
O Boletim Focus, que consolida as expectativas do mercado, projeta uma inflação de 4,55% para 2024, ultrapassando o teto de 4,5% da meta. Para 2025, a expectativa é de uma redução do IPCA para 4,0%, ainda acima do centro da meta de 3%. Esse cenário reflete a visão de que o processo de ajuste não deve resolver a questão da inflação no curto prazo, e o Banco Central pode precisar de mais medidas para restabelecer a confiança.
As expectativas de mercado são um termômetro importante para o Banco Central, que ajusta suas políticas com base nas projeções e nos dados reais de inflação. Manter a credibilidade junto ao mercado é fundamental, pois influencia diretamente a confiança nas políticas adotadas e, por consequência, na estabilidade econômica.
Pressões do Mercado de Trabalho e Atividade Econômica
O mercado de trabalho também tem se mostrado uma fonte de pressão para a inflação. Campos Neto afirmou que o mercado está “apertado”, ou seja, com uma oferta de mão de obra limitada em relação à demanda, o que pressiona os salários para cima. Esse fator é um dos motivos pelos quais a inflação persiste, mesmo diante das medidas de contenção do Banco Central.
Além disso, a economia brasileira tem mostrado sinais de resiliência, o que significa que os consumidores e investidores ainda mantêm um nível de atividade elevado. Em outras palavras, mesmo com o aumento da Selic, a demanda continua aquecida, o que pode levar o Banco Central a adotar novos aumentos de juros para desacelerar a economia de maneira mais eficaz.
Perspectivas Futuras e Compromisso com a Estabilidade
A fala de Campos Neto reforça o compromisso do Banco Central em controlar a inflação e restaurar a confiança do mercado. A combinação de altas na Selic, com um monitoramento constante dos setores de bens e serviços, tem como objetivo ajustar as expectativas inflacionárias e garantir a credibilidade do Banco Central. A estabilidade da moeda e o controle da inflação são essenciais para a saúde econômica do Brasil, especialmente em um contexto de pressão inflacionária global.
As decisões futuras dependerão dos próximos indicadores econômicos e da reação do mercado às medidas já adotadas. Contudo, a postura do Banco Central mostra que a instituição está atenta aos desafios e disposta a tomar as ações necessárias para garantir o alinhamento com a meta de inflação e a estabilidade da economia brasileira em longo prazo.